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Exclusivo com Paulo Turra: "O Vitória tem muito potencial, tem é de ter organização e pessoas honestas" – Flashscore.pt


Aos 50 anos, Paulo Turra, antigo central brasileiro, que passou, em Portugal, por Boavista e Vitória SC, já leva três clubes como treinador principal na carreira. O último foi precisamente em Portugal, ao serviço do Vitória, onde esteve apenas seis jogos, durante 42 dias. Em entrevista exclusiva ao Flashscore, recorda como foi convidado, com se deu a saída, elogia Jota Silva e lembra outros nomes com quem trabalhou, de Pepê a Arthur Cabral e Marcos Leonardo.

– O que anda a fazer o Paulo Turra atualmente, depois de deixar o Vitória SC em outubro?

– Obrigado pelo convite do Flashscore, é uma satisfação para mim voltar a falar para os meus amigos portugueses. Saí do Vitória no ano passado, apareceram algumas oportunidades para mim no Brasil e mesmo em outros países da América do Sul mas não foram concretizadas. Após a minha saída do Athletico Paranaense, onde ainda estava com a equipa técnica do Luiz Felipe Scolari, no Santos e no Vitória SC montei a minha equipa técnica. Então estamos a aproveitar este tempo para ajustar algumas coisas e estudar muito o futebol. O futebol hoje é muito complexo, depende muito do seu treinador. Hoje não temos mais Pelés, temos um ou outro Cristiano Ronaldo. O resto é do comando e ideias do treinador. Fazemos duas reuniões semanais, onde debatemos os jogos que determinamos para cada um assistir, eu com um dos adjuntos estamos a ter aulas de inglês. Gostaríamos de estar ali ao lado do campo, na linha lateral, mas vamos ocupando o tempo com o que mais gostamos de fazer, à espera que no momento certo as coisas aconteçam. Eu, desde que saí do Vitória SC, não quero trabalhar por trabalhar. Gostaria de ter um projeto desde início, com meio e fim. Sei que é difícil, sobretudo no Brasil, mas tenho esperança e convicção de que vai aparecer.

– Foi isso que faltou no Vitória? Não ter sido desde início e não ter ido até ao fim?

– Sinceramente, fui apanhado de surpresa pela minha saída do Vitória. Os resultados que estavam a acontecer não era para a saída de um treinador. Nem do Paulo Turra do Vitória nem de nenhum outro, principalmente tratando-se de Portugal, da Europa. Dentro do que o Vitória estava a jogar, enalteço muitas situações. Foram apenas 42 dias e o Vitória evoluiu. O meu modelo de jogo em relação ao anterior treinador era totalmente diferente, até nos treinos. Não tivesse esse tempo mas durante aquele período o Vitória evoluiu. O modelo de jogo do Vitória foi montado, os jogadores foram contratados, em cima de um 3x5x2. Eu não sou adepto do 3x5x2. Pouquíssimas vezes as minhas equipas jogaram nesse modelo. Mas eu dentro do que tinha, tive de me adaptar. A única modificação que fiz foi passar para 3x4x3, com o João Mendes do lado esquerdo, jogando com três atacantes. Considerava que o Jota Silva e o André Silva ficavam muito sozinhos. Esse acréscimo do Mendes, acho que a equipa pegou e evoluiu bastante. A prova é que o Álvaro Pacheco chegou e manteve. Em 40 dias não se podem fazer milagres. O Vitória, eu sempre falava para o Nuno Leite, que era vice-presidente e que estava sempre nos treinos, que o Vitória tem uma belíssima equipa, com jovens de tremendo potencial, que com trabalho chegaria no 5.º lugar, sem dúvidas. E foi isso que aconteceu. Fico triste por não ter dado continuidade e não foi por nenhum dos motivos que foram falados. Longe disso. Em todos os clubes que passei como jogador, sempre fui capitão e sempre fui líder. Também não foi por motivos táticos, pelo facto da equipa não estar a produzir. Fico feliz pelo Vitória, pela sua massa adepta, pelo ambiente que é vivido lá dentro, pelos atletas, pelo staff, que são muito bons e profissionais. E pronto, o Vitória fez a sua melhor da história e é merecedor. O Vitória, por tudo o que representa no futebol português, merece o que aconteceu nesse campeonato.

Classificação final do Vitória SCFlashscore

– Que diferenças sentiu do Vitória que encontrou como jogador e este agora, como treinador?

– A estrutura física, houve modificações internas, evoluiu a zona dos balneários, do departamento médico. Nem podia ser de outra forma, passaram-se 20 anos. Em termos de centro de treinos, continuam os dois campos, que eram bons naquela época e continuam. O Vitória evoluiu também na questão do staff, no suporte à equipa técnica. Tem profissionais de muita qualidade, com quem reuníamos diariamente. O Vitória, hoje, com essa campanha que fez, só demonstra o poder do clube, da cidade, da região. Se for bem organizado, com diretrizes, com regras, com a paixão do adepto, que às vezes é um pouco exagerada, com cobrança acima do normal, mas que temos de entender. É melhor ter adeptos assim do que adeptos que não comparecem. Com isso tudo o Vitória, com um investidor forte, tem condições de lutar diretamente com o SC Braga para ser o quarto grande. Tem muito potencial, tem é de ter organização e pessoas honestas, que conheçam o meio em que estão. 

– Não surpreendeu, então, este 5.º lugar do Vitória, mesmo com cinco treinadores numa só época.

– Não, não me surpreendeu. Sinceramente. E fiquei pouquíssimos dias no clube, mal conheci os funcionários do estádio. Mas dentro do que acompanhei, vendo os jogos dos adversários, e dentro da qualidade que o Vitória tinha, em termos de jogadores, não surpreendeu. Pode ter surpreendido bater o recorde de pontos, isso sim, mas a classificação não. Prova disso é a chamada do Jota Silva à seleção portuguesa. O último a ser chamado eu ainda era jogador. É um feito muito grande e o Vitória tem bons jogadores. Tem clubes que, tendo projeto de trabalho, mantendo uma base, quando vai ao mercado consegue ter ideias bem definidas, não é preciso um treinador para definir tudo isso. O ideal seria em conjunto, claro, mas acho que é mais fácil o clube montar um projeto com ideias bem definidas e, depois, contratar um treinador com esse perfil. O Vitória hoje tem um perfil que não é uma equipa de posse. Não é um Barcelona. O Vitória é uma equipa vertical, que defende bem, com jogadores muito agressivos, e quando tem a bola, com as características dos jogadores, é uma equipa muito vertical, com a velocidade e intensidade dos atacantes. Na maioria dos jogos pode ter a certeza que o Vitória não teve a maior posse de bola. Quando contra-ataca, com jogadores como o Jota Silva, é muito perigoso. É essa a característica e então, dentro disso, o clube vai buscar um treinador. 

– Já conhecia o Jota Silva quando chegou ao Vitória? Surpreendeu-o ver na Seleção portuguesa?

– Conhecia o Jota Silva de ver jogos do Vitória, do campeonato português, como via de outros campeonatos. Mas estando presencialmente, a visão é outra. É um jogador de extra classe. Tem muita força, muita velocidade, tem qualidade, e numa conversa que eu tive com ele, no jogo onde acabei por sair, que foi contra o Estoril, onde ganhámos em casa, estivemos quase uma hora a conversar após o almoço, no hotel. Conversámos sobre tudo, ele perguntou o que estava a achar, eu perguntei o mesmo e estivemos a trocar ideias sobre este futebol moderno. E eu falei para ele: ‘Jota, tu és um jogador deste futebol moderno. Tens é de fazer mais golos. Um atacante com as tuas características e com o teu perfil, tem de fazer golos’. Ele na época anterior, se não me engano, fez 3 ou 4 golos. Eu disse-lhe que ele tinha potencial para fazer muitos mais. E ele concordou, falou na modificação tática que eu fiz na equipa, que se sentia mais apoiado, e que já tinha feito cinco jogos comigo seguidos, sem sair, e que antes sentia essa dificuldade. ‘Este ano vai ser o teu ano’, disse-lhe eu. E fez uma época espetacular. Acompanhei depois o Vitória e dá gozo ver um jogador como o Jota, a entrega que ele tem, mesmo sem bola, a intensidade que impõe, a velocidade, a verticalidade… é contagiante. Acima de tudo, é uma pessoa do bem, um profissional de excelência e merece muito essa presença na seleção de Portugal. 

Os números de Jota Silva
Os números de Jota SilvaFlashscore

– O Paulo Turra, além de ter sido treinador do Vitória, também foi jogador, tal como o foi no Boavista. Acompanhou esta época dos axadrezados, com a manutenção garantida apenas na última jornada?

– Acompanhei, até porque o treinador que lá estava era o Petit, meu amigo, que agora está aqui no Brasil, a fazer um bom trabalho no Cuiabá. Então eu acompanhava, até por ser a minha ex-equipa, temos sempre carinho. Fui sempre bem tratado no Boavista. Fez um arranque muito bom, acho que foram 15 pontos nas primeiras seis jornadas, chegou a estar em primeiro, e depois começou a cair. Não é fácil com todos os problemas extra-campo. O resto do campeonato foi o reflexo, com a saída do Petit, com mais dois treinadores. Não é fácil uma equipa adaptar-se a vários treinadores, ainda mais com tantos jogadores tão jovens, perante o investimento do clube na formação. Mais o mais importante para o Boavista foi não ter sido despromovido. A partir daí, com a troca de presidente, e acredito que o investidor possa estar mais próximo do clube, o Boavista abre um horizonte que pode ser mais tranquilo. O Boavista é um dos históricos do futebol português. Depois da minha passagem pelo Boavista, quando eu saí, em 2004, e tudo o que aconteceu a seguir, com a caída nos campeonatos não profissionais… o futebol português fica muito mais pobre sem o Boavista. É um clube histórico, o último campeão fora dos grandes. Fez campanhas memoráveis na Liga dos Campeões e na Taça UEFA. Nós, em 2003, chegámos às meias-finais da Taça UEFA. Fico feliz pela manutenção do Boavista e fico esperançoso que com esta nova direção, liderada pelo Fary, que foi meu colega no Boavista, belíssimo avançado, possa dar um rumo, ter um projeto confiável. Porque a sua massa associativa é enorme, proporcionalmente parecida à do Vitória. Tem como rival um FC Porto, que é um gigante, caiu nas divisões inferiores e continua a ter o estádio composto. O povo boavisteiro merece, depois de todo esse sufoco, campanhas confiáveis. Torço muito que com o Fary possa ter um rumo que o Boavista mereça.

– Um projeto confiável, com o amigo Fary, seria o ideal para um regresso do Paulo Turra a Portugal?

– Quando eu recebi a mensagem do presidente do Vitória, pelo Facebook, a perguntar se eu tinha interesse em regressar à Europa como treinador, eu respondi que era um dos meus sonhos. Não é por ter saído 40 dias depois de ter chegado que deixo de gostar do Vitória, bem pelo contrário, ou de Portugal. Quando estive como jogador, e agora como treinador, fui sempre bem tratado e respeitado. Não só o Boavista, mas por ter tido uma grande história como jogador, é lógico que teria imenso prazer em voltar a trabalhar lá.

– O Paulo Turra teve vários anos como adjunto de Luiz Felipe Scolari, onde trabalhou jogadores como Pepê, que vai estar agora na Copa América. O que espera do Brasil nesta competição?

– Tenho muita esperança no Brasil. Quem está lá, o Dorival, é um treinador espetacular, com provas dadas, um técnico tranquilo, ponderado, que tem a sua ideia de jogo muito bem definida, uma gestão de grupo muito boa. Depois o Rodrigo Caetano, o novo CEO da CBF, jogou comigo no Caxias em 1997, conheço-o muito bem, falo com ele semanalmente. É um profissional muito competente e juntamente com o Cícero, que trabalhou comigo no Palmeiras em 2018, quando eu era adjunto do Luiz Felipe Scolari, e que está agora como diretor da CBF, e que tem um conhecimento muito grande. Não devia ser assim mas hoje a CBF tem muitas dificuldades para ter um projeto. E, pelo menos, foram contratados estes três profissionais de excelência, cada um na sua área. E através desses profissionais, acredito muito que o futebol brasileiro, a sua seleção, possa estar a dar os primeiros passos para voltarmos a ter orgulho da nossa seleção. Tenho muita esperança porque são profissionais de muita capacidade. E essa safra de novos jogadores que estão a surgir no futebol brasileiro, como o Endrick, o Vítor Roque, que trabalhou comigo no Athletico Paranaense, o Pepê, o Raphinha, Galeno, tantos outros, como Vinícius Júnior e Rodrygo, que nem adianta falar, são jogadores que têm o ADN do futebol brasileiro. Estão na Europa, evoluíram na parte tática mas perderam a sua individualidade, não perderam o ADN do futebol brasileiro, que sempre foi o futebol do drible, do improviso, do reportório. Tenho muita esperança, pelos particulares que vi do Dorival, que a seleção brasileira possa dar na Copa América o primeiro passo rumo à reabilitação total do futebol brasileiro. 

– Além do Pepê e do Vítor Roque, trabalhou com dois avançados que estão agora no Benfica, Arthur Cabral e Marcos Leonardo. Principais diferenças e razões para a não afirmação de Arthur Cabral no Benfica?

– São dois jogadores espetaculares, dentro e fora do campo, que tive o prazer de conhecer e trabalhar. E são dois jogadores totalmente diferentes. Porém, são ambos de área. Acredito que o Arthur Cabral não teve o sucesso que os adeptos do Benfica imaginariam, também porque a equipa não esteve bem. O Arthur Cabral, dentro dessa realidade, fez 11 golos. Para um jogador que chegou da Fiorentina, chegar num clube que não teve uma época ao nível do Benfica, não foi tão mau. Porém, quando se contrata um avançado que fez golos no Ceará, no Palmeiras não teve assim tanto sucesso porque ele teve uma lesão na púbis que o deixou quase cinco meses afastado. E isto ninguém sabe, ou pouquíssima gente sabe. Mesmo assim despertou o interesse do Basileia, fez golos em todas as épocas, foi para a Fiorentina e foi igual. No momento em que vou contratar um jogador que está num dos maiores mercados da Europa, o italiano, tenho de saber que se encaixa dentro do perfil de equipa que eu tenho. Acredito que o perfil de jogo do Benfica não favoreceu o Arthur Cabral. Ele não é um avançado para vir buscar jogo, para puxar marcações e abrir espaços para o médio. Ele é um jogador de área, tem de ser servido, usado como pivô à antiga, pelo perfil físico que tem e sabe usar. Ele tem de ter assistência, companheiros que cheguem à linha de fundo e cruzem. Dentro da área ele é mortal. E acho que todos os golos que ele fez foram dentro da área e sempre com velocidade de raciocínio e qualidade. São essas as características dele. Tal como Haaland, por exemplo. O Guardiola esteve seis ou sete anos a defender uma coisa antes de abrir mão do seu perfil de jogo favorito para contratar um jogador de área. E a verdade é que foram campeões e ganharam a Liga dos Campeões. Com as devidas proporções, o Arthur Cabral é um jogador desse género. Se ele ficar no Benfica, tal como o treinador, quem sabe os reforços possam jogar de acordo com o avançado que têm. O Benfica pagou 20 milhões por ele. Foi o Arthur que não esteve bem ou o Benfica que não teve bem e não o suporte que ele precisa? O Arthur não é o Pelé nem o Cristiano Ronaldo, não resolve jogos sozinho. É um jogador muito bom mas precisa de suporte para ser ainda mais efetivo.

Os números de Arthur Cabral
Os números de Arthur CabralFlashscore

– E o Marcos Leonardo?

– O Marcos Leonardo é um jovem, trabalhou comigo no Santos. Quando eu cheguei ele estava há 15 jogos sem marcar. No segundo dia de trabalho sentei-me com ele e disse-lhe: ‘Marcos, a partir de agora ficas dentro da área, o teu lugar é dentro da área.’ O Marcos é um jogador que, se deixares, ele vai até defender, feito central. Ele quer jogar, quer ter bola. E dizia-me que tinha de sair da área para ter bola. ‘A bola vai chegar a ti. Se não chegar, a culpa não é tua, é minha e dos teus colegas’, disse-lhe eu. Comigo, em sete jogos, ele fez cinco golos, todos dentro da área. É um jogador de transição, que dentro da área tem uma velocidade de raciocínio muito rápida e os golos no Benfica provam-no. São jogadores que precisam de ter mais tempo de adaptação aos colegas, ou o contrário, mas com um potencial enorme. O Marcos Leonardo tem 20 anos. O Vinícius Júnior quando chegou no Real Madrid precisou de tempo. O futebol brasileiro é muito diferente do europeu. O Benfica tem de saber que tem dois avançados de muita qualidade, que muitas equipas gostariam de ter, e fazer com que a equipa possa jogar para eles ou, com o trabalho da equipa técnica, que eles se possam adaptar às ideias da equipa. Parece-me que o problema é um pouco como aqui no Brasil. É trabalhar de manhã para comer ao meio-dia e trabalhar de tarde para comer de noite. As coisas têm de ser muito rápido e em muitos casos as coisas não são assim. Volto a dar o exemplo do Vinícius Júnior, que jogou no Real Madrid B, e hoje está cotado para ser o melhor do mundo. Tudo precisa de tempo, calma, planeamento. Se com planeamento é difícil, imagina sem ele. 



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Marc Valldeperez

Soy el administrador de marcahora.xyz y también un redactor deportivo. Apasionado por el deporte y su historia. Fanático de todas las disciplinas, especialmente el fútbol, el boxeo y las MMA. Encargado de escribir previas de muchos deportes, como boxeo, fútbol, NBA, deportes de motor y otros.

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